Além de chocar pelas causas do acidente e pelo número de vítimas, a tragédia na BR-277 foi marcada pela divulgação de imagens impróprias nas redes sociais.
tragédia ocorrida no domingo (02), na BR-277 em São José dos Pinhais, Paraná, chocou o Brasil inteiro. Uma pela sequência de fatos que ocasionou o acidente: condição adversa de tempo (neblina) combinada com uma ocorrência de fumaça na pista que culminou com a falta de visibilidade no local. Outra pelo número de pessoas envolvidas e ainda pelas informações que correram as redes sociais nos momentos seguintes.
O acidente envolveu 22 veículos e até o momento foram registradas oito mortes em decorrência da fatalidade. Mais de 20 pessoas ficaram feridas.
Para Celso Alves Mariano, especialista em trânsito e diretor do Portal, dirigir em boas condições do condutor, do veículo, da via e do tempo, já não é suficiente para baixar a guarda em relação à segurança.
“Quando condições adversas como noite, neblina, fumaça estão presentes, o cuidado necessário com a segurança deve ser significativamente maior. Quando uma tragédia assim acontece, salta aos olhos o que poderia ter sido feito para evitá-la”, explica Mariano.
Conforme o especialista, de todos os fatores envolvidos, da velocidade inadequada à falta de preparo dos condutores para novas situações de risco geradas pelo próprio acidente, quase tudo poderia ter sido evitado. “Até a neblina, fator incontrolável porque depende do humor de São Pedro, poderia ser contornada, com um planejamento de viagem mais cuidadoso”, afirma.
Imagens da tragédia da BR-277 compartilhadas nas redes sociais
Entre os inúmeros fatos que deixaram a sociedade perplexa está a divulgação de imagens de corpos momentos após o acidente. “São fotos e vídeos compartilhados em redes sociais que chocam tanto quanto a tragédia em si”, argumenta Mariano.
Anna Maria Garcia Prediger, que é educadora de trânsito, afirma que não há necessidade alguma de expor assim as vítimas e muito menos os seus familiares. “Você gostaria de ver seus parentes ou amigos expostos desta forma, em um momento de tanta vulnerabilidade? Tenho certeza que não”, diz a educadora.
Ainda segundo Anna Maria, essa atitude não serve para conscientizar ninguém. “Pelo contrário, esse tipo de imagem banaliza a morte e gera mais insensibilidade”, conclui.
Além de uma falta de respeito e empatia com as vítimas e seus familiares, fotografar, filmar e divulgar essas imagens pode ser considerado um crime.
Dra. Mércia Gomes, especialista em Direito de Trânsito, cita a Lei 13.709/18, que é a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais e diz que é proibido, aos anônimos, divulgar informações como placas de veículos e nomes ou rostos de pessoas. “Se vier violar a privacidade é entendido que há a possibilidade de reparar o dano. Até porque essa lei deixa claro que os meios digitais também causam mal à pessoa”, diz.
A especialista aponta o fato de que esses vídeos podem chegar a um familiar.
“Esses anônimos que estão no local do fato, que registram e jogam essas imagens nas redes sociais, especificamente através do WhatsApp, talvez não pensem que isso pode chegar no número de telefone de um familiar. Se essa pessoa tiver acesso ao vídeo e reconhecer seu ente querido, ela pode buscar a reparação desse dano através do Judiciário”, indica Gomes.
Código Penal
Outro possível enquadramento seria no artigo 212 do Código Penal Brasileiro, que considera o vilipêndio de cadáveres um crime contra o respeito aos mortos. Esse ato pode ser punido entre um a três anos de reclusão e pagamento de multa. “Para esclarecer, o verbo vilipendiar significa destratar ou humilhar; tratar com desdém; fazer com que algo ou alguém se sinta desprezado ou desdenhado; menosprezar; julgar algo ou alguém por baixo; não validar as qualidades de; ofender através de palavras, gestos ou ações. Então, se as imagens estiverem claras e a família for buscar esse dano o responsável pode ser condenado pelo Art. 212 do Código Penal”, afirma.
Ainda conforme a especialista, é importante se discutir o motivo que leva a pessoa a ter uma atitude como essa. “Temos que destacar o fato das pessoas divulgares essas imagens nas redes sociais sem se preocupar quem é a pessoa, se a família vai receber essas imagens. Como especialista em direito de trânsito, é muito triste ver esse tipo de notícia, com esse número de mortes, é uma catástrofe”, conclui.